A Piada Mortal

Mário Latino


Se O Cavaleiro das Trevas é a obra definitiva do Homem-Morcego, cabe à Piada Mortal fazer a abordagem mais intimista dele.

Todo leitor de HQ que se preze sabe que o Coringa é um psicótico capaz das maiores atrocidades. Mas que aconteceria se essa força do mal fosse o resultado de trágicas casualidades? Tal possibilidade foi colocada pelo roteirista Alan Moore em 1988.

A história da Piada Mortal começa com uma visita do Batman ao asilo Arkham. O motivo? O Morcego quer ter uma conversa definitiva com seu pior inimigo, o Coringa, antes que ambos acabem se matando. Só que ele chega tarde. O Palhaço do Crime escapou, deixando um comparsa no seu lugar.

Nesse ponto a narrativa se desdobra. Voltamos ao passado para descobrir que o Coringa era um comediante desempregado. Com a esposa grávida e passando por graves problemas econômicos, recebe o convite para participar no assalto a uma indústria química. Nosso homem se debate entre seguir pelo caminho honesto e o dinheiro fácil. É nesse momento que recebe uma péssima notícia, sua esposa sofreu um acidente enquanto testava um aquecedor de mamadeiras elétrico. Ela acaba falecendo no hospital. Balançado e sem rumo, acaba aceitando o convite dos marginais.

Tudo dá errado. A polícia e o Batman estão no lugar do crime. O comediante cai num recipiente de lixo tóxico. Com os nervos abalados, conseqüência da cadeia de eventos trágicos narrados, nosso personagem enlouquece. Nasce, assim, o Coringa. Esses elementos da história foram aproveitados no primeiro filme do Batman, com Jack Nicholson interpretando o papel do Coringa.

Na outra linha narrativa, no presente, o Coringa vá até a casa de James Gordon. Após cravar uma bala na espinha de Bárbara - que na verdade é a Bat-moça - leva o comissário como refém. Nas instalações de um circo abandonado, Gordon é submetido a uma série de torturas cujo único objetivo é enlouquecê-lo. O ambiente é dantesco, cheio de mostrengos e personagens de pesadelo. Ambas narrativas se entrecruzam a cada momento numa das melhores performances que a arte seqüencial já viu.

Batman visita Bárbara no hospital e, após breve conversa, parte à procura do comissário. Horas mais tarde um cartão de visita sugere que o Palhaço do Crime pode estar escondido num circo abandonado.

Este confronto entre o Morcego e o Coringa está marcado pelo aspecto psíquico. Enquanto lutam, o vilão afirma que não há diferença entre sua loucura e a do mundo que o rodeia. Nesse ponto ele está certo.

No final o Coringa é derrotado. Mas, antes de Batman levá-lo de volta para o asilo Arkham, vilão e herói conversam. O diálogo é antológico. O Morcego se oferece para ajudá-lo a encontrar o caminho da regeneração. Do contrário, ambos estarão condenados a colidir novamente, até que algum deles morra.

O Coringa responde que é tarde demais para pensar nisso. Então conta a velha piada dos dois loucos que fogem do asilo. Um deles pula o muro, mas o outro tem medo. O louco que pulou liga a lanterna e diz para o companheiro descer pelo facho de luz. Então o louco que ficou responde: "E se você desligar a lanterna quando estiver no meio?". A piada é velha, velhíssima.

O Coringa ri enquanto Batman, taciturno, observa. Devagar, as feições enrijecidas do Homem-Morcego esboçam um sorriso. Depois ri, meio forçado. Finalmente gargalha com o Coringa. Como dois moleques. Um carro da policia chega. A sirene berra. Chove. Vilão e herói se abraçam. Brutal.


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