Batman: Ano Um

Ou como se constrói um herói

Mário Latino

De todos os trabalhos de Frank este é um de meus favoritos, ao lado de “A Queda de Murdock”. Isso por várias razões. Uma delas é que Miller ainda se sentia na obrigação de mostrar serviço e estava com a corda toda. Era o final da década de 80 e o rapaz não parava de assombrar aos leitores com trabalhos como Ronin, Cavaleiro das Trevas e Elektra Assassina. Seu entusiasmo com os quadrinhos como meio de expressão e a vontade de explorar as inúmeras possibilidades narrativas em ousadas diagramações e artifícios técnicos, era evidente. Mesmo não sendo um desenhista à altura, pelo menos de suas habilidades narrativas, ele conseguia fazer que todo se subordinasse à trama. O resultado era, no mínimo, espetacular. Depois, de maneira inexplicável para àqueles que curtíamos seu trabalho, a chama se extinguiu e Miller virou um roteirista cansado, desmotivado e sem conteúdo. Seus trabalhos se tornaram um amontoado de clichês e frases de efeito, à moda de Mickey Spillane. Como um zumbi moribundo alastrou-se por verdadeiros fiascos como Demolidor:Ano Um, a série em P/B Sin City, Elektra lives again, Bad Boy (com desenhos de Simon Bisley) e 300 para terminar no maior engodo de todos os tempos: O Cavaleiro das Trevas 2.

Mas, voltando a nosso assunto, vários fatores incidiram para que este trabalho tenha atingido a estatura de clássico. Um deles foi que Miller soube recuperar todos os elementos clássicos da personagem e com eles construir uma história densa e cativante, que foi sendo moldada através de duas tramas paralelas, as histórias de Bruce Wayne-Batman e o Tenente James Gordon.. Outro elemento importante é que a responsabilidade pelo trabalho gráfico recaiu em David Mazzucchelli, um artista de formação clássica que soube dar vigor e equilíbrio as cenas planejadas pela diabólica mente de Miller. Se o trabalho tivesse sido designado a um de tantos “artistas” do main-stream o resultado teria sido catastrófico. Essa foi a grande sacada: uma história clássica contada através do pincel de um desenhista clássico.

Batman: Ano Um foi publicado em quatro capítulos e o título de cada um define perfeitamente o episódio respectivo. O capítulo um, “Quem eu sou e como vim a ser”, narra a volta de Wayne a Gotham City após de anos de ausência nos quais passara se exercitando para combater o crime. Casualmente nesse mesmo dia, um novato tenente James Gordon chega à cidade para reforçar o corpo de polícia, dirigido pelo corrupto comissário Loeb. É interessante que a visão de ambas personagens, Wayne e Gordon, são diferentes mas complementares.

Wayne terá que escolher um método para combater o crime enquanto Gordon terá que encontrar seu lugar, ao lado do comissário Loeb ou ao lado da justiça. Ele escolhe o lado da justiça e enfrenta o policial corrupto Flass. Enquanto isso, Wayne visita o que ele chama de “o acampamento do inimigo” e se dá mal. Descobrirá, ferido pela faca de uma prostituta, que necessita vestir uma fantasia para infundir medo nos criminosos. É então que um morcego quebra a janela da mansão. Wayne encontrou a resposta que queria: “Eu me tornarei um morcego”.

O capítulo dois, “Declaração de Guerra”, nos mostra a Gordon enfrentando problemas com o pessoal do departamento de polícia enquanto Batman combate o crime.

As primeiras aparições do Homem-Morcego chamam a atenção da imprensa e também da polícia, que faz de tudo para prender o fantasiado. Batman invade uma festa e avisa: “Comeram a riqueza de Gotham...seu espírito! O banquete acabou! De hoje em diante ...nenhum de vocês estará a salvo!” A responsabilidade pela captura do encapuzado recai nos ombros de Gordon e ambos acabam se encontrando, quase por casualidade. Batman, ferido, se refugia num prédio abandonado e Loeb ordena a Branden que jogue bombas nele.

O capítulo três, “Aurora Negra” traz a frase: “Eles o encurralaram.Estavam em maior número. Fizeram dele um prisioneiro. Eles estão em maus lençóis”. Pode ser uma frase de efeito, mas ele resume a ação trepidante deste episódio, para mim o melhor da saga, no qual um Batman ferido e praticamente com os mínimos recursos enfrenta a SWAT e escapa ileso, diante dos olhares de centenas de espectadores, entre os quais se inclui Selina Kyle, a futura mulher gato. Gordon ainda se envolverá com a policial Sara Essen, apesar de sua esposa estar esperando um filho. A vida de Gordon não está nada fácil.

O episódio quarto, “Amigo em apuros”, mostra o nascimento da mulher gato e o momento em que Gordon conta para sua mulher que está tendo um caso com a sargento Essen. O filho dele é raptado pelo pessoal de Romano, um dos mafiosos que controla Gotham e Wayne-Batman impede o sucesso da ação.

É o início de uma longa amizade entre o novo herói da cidade e, o agora capitão, Gordon. O capítulo termina com Gordon esperando no topo do edifício da polícia. “Quanto a mim...bom, estou com um problema sério. Alguém ameaçou envenenar o reservatório de Gotham. O nome do louco é Coringa”. O restante da história nós já conhecemos.


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